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Hiolanda Vieira

Escrevo à distância de 40 anos, e alguma nostalgia invade o meu pensamento ao descerrar a gaveta das memórias e o baú das recordações.

Que feliz fui, nos anos letivos 1982/83 e 1983/84, quando lecionei na Escola Preparatória de Santana! Foi uma maravilhosa experiência de vida. Sem as burocracias exageradas da atualidade, conhecia os alunos pelo nome e conseguia compreender os seus anseios e os seus sonhos, pois havia tempo para tal.

Belas memórias! Recordo agora com saudade, os momentos únicos de sã camaradagem e alegria partilhada entre a maioria dos colegas e funcionários. Recordo os alunos, as aulas alegres, os alunos tão novinhos, mas ávidos de assimilar novos conhecimentos! Respeitadores, mas sem necessidade de impor o respeito.

Era Presidente da comissão instaladora o Senhor Padre Isidro Rodrigues, pessoa muito reta, de caráter forte, mas que soube muito bem orientar os destinos de uma recém-formada escola.

No fulgor dos meus vinte e poucos anos (fase etária em que todos os sonhos são possíveis e as barreiras não são obstáculos intransponíveis) e a paixão pela profissão, senti-me uma profissional realizada. Era uma escola dinâmica. O corpo docente era maioritariamente jovem. Éramos poucos, mas dávamo-nos bem.

Alguns docentes e alunos criaram, de forma informal, um grupo de teatro, que levou alegria a muitos. Havia muita cooperação entre todos os colegas e muita responsabilidade. As nossas obrigações eram escrupulosamente cumpridas, para evitar os “raspanetes” por parte do Senhor Padre Isidro, que às vezes eram duros.

As acessibilidades eram difíceis, as vias-expresso e vias-rápida não existiam. Alguns colegas do Funchal, ou de outros locais da ilha, necessitaram de alugar um quarto. Sentiam-se solitários. Estavam com a família somente ao fim de semana. De quando em vez, preparávamos um convívio entre colegas. Era uma forma de confraternizarmos e consolidar a amizade e o companheirismo entre nós e esbater a monotonia em alguns dias.

Entre os alunos, professores e funcionários havia muita alegria, uma palavra amiga e um sorriso! O almoço na cantina era acompanhado com muitos risos e terminava, geralmente, servido com deliciosas gargalhadas, pois o professor Renato Barros, da comissão instaladora, tinha o dom de pôr todos a rir.

Algo que me marcou muito foi o fato de uma percentagem muito significativa de alunos, na disciplina de português, quando solicitado o retrato físico e psicológico de alguém, retrataram o professor Renato e eu. Li vários desses “retratos” e fiquei muito comovida por sermos tanto e tão bem retratados e de forma tão carinhosa. Recordo a festa da centésima lição de uma das turmas! Que surpresa tão agradável! Além dos iguarias, sumos e bolos, repletas de carinho, numa mesa bem decorada, os alunos coreografaram uma canção premeditada ao momento. Lembro-me de um pequeno excerto da referida canção: “Tu és uma flor entre as flores de um jardim, botão de rosa a florir”.

Na festa de encerramento do ano letivo de 1983/84, no intervalo do espetáculo, observei duas alunas chorando. Aproximei-me para saber o que se passava. Inicialmente, afirmaram que não era nada. Depois de alguma insistência, disseram-me que estavam chorando porque a senhora professora ia embora e já não ia ser a sua professora! Simplesmente, abracei-as, emocionada, e uma torrente de lágrimas teimaram molhar o meu rosto. Expliquei que adorei tê-las como alunas. Necessitava de terminar a licenciatura, a minha formação profissional e, em Santana, tornava-se muito mais difícil conciliar os estudos com a vida profissional e pessoal.

Depois de todo este tempo, recordo com emoção todos os momentos vividos! Ficarão para sempre na minha memória e no meu coração!

A todos os ex-alunos, colegas e funcionários, que me deixaram um bocadinho de si, considero que levaram um pouquinho de mim, digo Obrigada por terem partilhado comigo esta experiência na Escola Preparatória de Santana, hoje Escola Básica e Secundária Bispo Dom Manuel Ferreira Cabral.

Professora provisória do 4.º grupo, nos anos letivos de 1982 a 1984 (estudante trabalhadora).